Cisto Ganglionar Intra Neural – Ganglion
O cisto ganglionar intra neural é uma lesão rara, caracterizada pela sua presença dentro de um nervo periférico. Trata-se de uma formação benigna que contém um líquido gelatinoso similar ao encontrado nos cistos ganglionares comuns, os quais geralmente ocorrem perto de articulações ou tendões.
A localização intra neural, no entanto, diferencia esse cisto por causar sintomas específicos relacionados à compressão do nervo afetado, ocasionando sintomas de neuropraxia, que podem evoluir para paralisia motora. Por isso, deve ser tratado assim que diagnosticado, evitando-se a consequente degeneração gordurosa da musculatura envolvida, o que inviabilizaria a recuperação funcional.
A patogênese dos cistos intra neurais tem duas teorias: uma que sugere a formação cística isolada dentro do nervo devido a um processo degenerativo, enquanto a outra sugere que os cistos se originam de uma articulação vizinha, estendendo-se das articulações ao longo da adventícia de um ramo articular, assim como fazem ao longo do perineuro dentro dos feixes neuro vasculares, dada a forte associação de cistos intra neurais com articulações próximas.
Uma teoria unificada, baseada no nervo fibular, que é o mais comumente afetado, sugere que cistos para-articulares surgem de articulações com pressão intra-articular elevada. Essa pressão faria com que o material cístico se estendesse por rupturas ou regiões enfraquecidas da cápsula articular, seguindo caminhos de menor resistência, resultando em cistos tanto extra neurais quanto intra neurais. Essa teoria também foi estendida para explicar cistos em outros nervos, como o tibial, ulnar, mediano e supra escapular, em diversas articulações.
Os cistos podem se propagar por várias rotas, incluindo artérias, veias e nervos, levando a diferentes combinações de cistos. A presença simultânea de cistos intra neurais em nervos distintos, como o fibular e o tibial, associados a cistos vasculares e intramusculares no mesmo local, sugere uma relação causal comum, reforçando a ideia de um mecanismo compartilhado na formação desses cistos.
O tratamento cirúrgico, executado com a descompressão articular e a neurolise, deve ser o mais precoce possível. Estes cistos ganglionares intra neurais podem causar uma variedade de sintomas, dependendo do nervo envolvido e da extensão da compressão. Os sintomas comuns incluem dor, fraqueza muscular, dormência e parestesias (sensações anormais, como formigamento). Esses sintomas podem ser progressivos, à medida que o cisto aumenta de tamanho, exercendo maior pressão sobre as fibras nervosas.
O diagnóstico de um cisto ganglionar intra neural geralmente envolve a realização de exames de imagem, sendo a ressonância magnética (RM) o melhor método para o diagnóstico. Esses exames permitem a visualização do cisto e ajudam a determinar sua localização, tamanho e eventual compressão articular existente. A ressonância magnética pode ser complementada pela tomografia neste estudo articular, que, associada à RM, torna-se mais eficaz para avaliar a relação do cisto com as estruturas nervosas e osteoarticulares adjacentes.
O tratamento de cistos ganglionares intra neurais pode variar dependendo da gravidade dos sintomas e do impacto na função nervosa. A aspiração com agulha guiada por ultrassonografia pode ser realizada para drenar o conteúdo do cisto. No entanto, há o risco de recorrência, pois a aspiração não remove a parede do cisto e não trata a compressão articular, quando existente.
Em casos de sintomas graves ou progressivos, a remoção cirúrgica do cisto pode ser necessária. A cirurgia visa remover o cisto completamente, incluindo sua parede, para minimizar o risco de recorrência, além de realizar a descompressão articular. O procedimento cirúrgico deve ser cuidadoso, visando preservar a integridade do nervo afetado.
O prognóstico para pacientes com cisto ganglionar intra neural é geralmente bom, especialmente quando o diagnóstico é precoce e o cisto é tratado adequadamente. A remoção cirúrgica completa tende a oferecer os melhores resultados, com alívio significativo dos sintomas e baixo risco de recorrência. No entanto, a recuperação pode depender da extensão da lesão nervosa pré-existente e da eficácia da intervenção cirúrgica.
Em resumo, o cisto ganglionar intra neural é uma condição rara que pode causar sintomas neurológicos significativos devido à compressão nervosa. O diagnóstico precoce e o tratamento adequado são essenciais para prevenir danos nervosos permanentes e proporcionar alívio sintomático aos pacientes afetados.
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Giroplastia de Van Nes & Transplante Autólogo de Cartilagem de Crescimento
Albert G. Van Nes, cirurgião holandês, descreveu sua técnica cirúrgica chamada “giroplastia de Van Nes” ou “rotação de Van Nes”, em 1950.
Esta técnica consiste em uma ressecção intercalar e a rotação de 180 graus do membro inferior, de modo que o tornozelo passa a funcionar como uma nova articulação do joelho. A técnica de Van Nes foi inicialmente desenvolvida para tratar casos de sarcoma de Ewing e osteossarcoma, especialmente em crianças, permitindo uma alternativa à amputação total do membro.
A ideia era criar um “joelho biológico” utilizando o próprio tornozelo do paciente, uma vez que as tecnologias protéticas da época não eram avançadas ou acessíveis. A giroplastia de Van Nes permite que o paciente utilize órtese de forma mais eficiente, mantendo uma funcionalidade mais natural e uma melhor qualidade de vida em comparação com a amputação tradicional
Nesta aula, vamos discutir o tratamento dos sarcomas ósseos que afetam as crianças em crescimento, apresentando a técnica de Van Nes e o auto transplante de cartilagem de crescimento.
Na década de 1980, a literatura indicava a amputação dos membros acometidos por sarcomas ósseos em crianças menores de 10 anos de idade. Isso se devia tanto aos recursos cirúrgicos da época quanto aos altos índices de maus resultados com a cirurgia conservadora, em virtude da acentuada discrepância dos membros que ocorreria com o crescimento. Outros dogmas também estabeleciam a ablação nos casos de envolvimento vascular.
Ainda no Congresso Brasileiro de Ortopedia de 1988, realizado em Brasília, esse conceito era consenso. Entretanto, já contestávamos essa premissa, afirmando que o comprometimento vascular poderia ser contornado com a realização de enxertos vasculares, apresentando casos que tratamos com ressecção oncológica e reconstrução com anastomose vascular, como este caso de osteossarcoma envolvendo a artéria e a veia poplítea, que foi ressecado em bloco e reconstruído com enxerto vascular e endoprótese.
Naquela época, a cirurgia ablativa era indicada para lesões tumorais que envolviam o feixe vascular, para aquelas que apresentavam comprometimento dos tecidos moles, para tumores com mais de 12 cm ou com fratura, e também para lesões neoplásicas em crianças menores de 10 anos. Para esses casos, a amputação era uma das alternativas.
Entretanto, em 1992, conhecemos o Professor Capanna no congresso da SBOT, em São Paulo, que nos apresentou a técnica de Van Nes, indicada para esses casos. Essa giroplastia consiste em uma ressecção intercalar, criando uma deformidade de difícil aceitação em nosso meio latino, requerendo consentimento por parte do paciente e familiares, além de apresentar dificuldades na confecção da órtese para o paciente.
Optamos pela giroplastia de Van Nes em dois casos, visto que essa técnica não impediria uma futura conversão para amputação, caso não houvesse sucesso.
No primeiro caso, tratava-se de um osteossarcoma no terço distal da coxa direita, comprometendo o fêmur, os músculos e o feixe vascular da região. A indicação da giroplastia foi executada, realizando-se uma ressecção oncológica intercalar, ao invés de uma amputação total ao nível do terço proximal do fêmur. Optamos por realizar a Giroplastia de Van Nes, que consiste em uma ressecção intercalar dos dois terços distais da coxa e do segmento proximal da perna, com preservação do feixe vascular (artéria e veia) e do nervo ciático. Trata-se de uma ressecção em bloco, incluindo pele, músculos, ossos e tecido subcutâneo da região, com margem oncológica, preservando a irrigação e inervação da extremidade remanescente.
Na Giroplastia de Van Nes, executamos uma rotação de 180° da extremidade inferior do membro operado e calculamos a extensão necessária do segmento da perna operada, de modo que, ao final da maturidade esquelética do paciente, o nível final da articulação do joelho sadio esteja equiparado ao do tornozelo contralateral. Dessa forma, o nível da articulação do joelho sadio ficará simétrico ao do tornozelo do lado operado, que funcionará como uma neo-articulação, proporcionando simetria ao paciente na posição sentado.
A placa de crescimento da tíbia esquerda, que é o lado sadio, tem um potencial de crescimento maior do que a placa distal da tíbia direita, que é a do lado operado. Esse maior potencial de crescimento, somado ao maior tamanho deixado, permitirá alcançar simetria ao final da puberdade. Tivemos dificuldade em confeccionar essa órtese sob medida, mas ela apresentou um bom resultado funcional, com apoio terminal no pé e propriocepção. Entretanto, a aceitação por parte dos familiares foi bastante problemática.
Ainda em 1997, a literatura mundial indicava a amputação como tratamento para tumores do membro inferior em crianças menores de 10 anos de idade, devido à futura discrepância do membro inferior. Chamamos a atenção para o fato de que a placa de crescimento da fíbula fica ao nível da articulação do tornozelo, enquanto a placa de crescimento da tíbia se encontra em um nível superior. Planejamos, assim, uma transferência da fíbula distal para a tíbia após a ressecção do tumor. Vale destacar que a artéria nutrícia da fíbula e sua placa de crescimento entram no terço proximal da fíbula. Portanto, nossa osteotomia fibular deve ser realizada acima dessa entrada. Precisamos também realizar uma janela lateral para o encavilhamento proximal, seguida da criação de uma cavidade no tálus para receber a epífise fibular com sua placa de crescimento.
Vamos realizar uma artrodese entre o tálus e a tíbia remanescente, utilizando a epífise fibular com sua cartilagem epifisária já removida, transladando-a pela membrana interóssea. Dessa forma, executaremos uma transferência da cartilagem de crescimento da fíbula para a tíbia, realizando um autotransplante da placa de crescimento através da membrana interóssea.
Para finalizar a artrodese, fazemos uma cavidade oval no tálus para adaptar a epífise fibular, completando assim a artrodese com a integração da epífise fibular. Finalizamos esta reconstrução fixando com um pino de Steinmann pelo calcâneo. Acomodamos o membro operado na órtese modelada para esta paciente, obtendo uma transferência da placa de crescimento da fíbula para a tíbia, finalizando assim o procedimento.
No primeiro caso, com cinco meses, pudemos observar a neoformação óssea e a transferência da placa fibular para a tíbia. No mapeamento, constatamos que este segmento estava vascularizado, confirmando o sucesso deste autotransplante. Com um ano e cinco meses, pudemos observar a boa integração óssea e o espessamento da nova tíbia com a placa fibular transladada e viável. Após dois anos, a paciente apresentava bom apoio e função, tanto em flexão dos joelhos quanto em carga monopodal.
No segundo caso de autotransplante de cartilagem ao nível do tornozelo, observamos uma lesão de rarefação óssea na metáfise distal da tíbia, com limites imprecisos que ultrapassavam as corticais, lateral, anterior e posterior. A cintilografia apresentava aumento de captação no tornozelo, evidenciado no PET-CT. Nos cortes de ressonância magnética axial e sagital T2 com supressão de gordura, observamos um tumor extra cortical de grande volume, com alto sinal. Confeccionamos um molde gessado inguino-podálico para servir de base para a órtese que foi confeccionada sob medida. A radiografia final confirmou o posicionamento do fio de Kirchner, estabilizando a reconstrução.
Agradeço aos ensinamentos recebidos do Prof. Rodolfo Capanna, desde 1992, e à contínua troca de conhecimentos com o Prof. Eduardo José Ortiz Cruz, de Madri, Espanha.
Realizamos esta técnica de autotransplante em outras crianças, em diferentes ossos, como úmero e tíbia, que publicamos na revista SpringerPlus.
Link: https://springerplus.springeropen.com/articles/10.1186/s40064-016-2042-7
Concluímos, com nossa experiência que “o transplante autólogo de cartilagem de crescimento é uma boa alternativa para as reconstruções biológicas em crianças.”
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Endoprótese em Revisões de Artroplastias
As endopróteses não convencionais, empregadas na oncocirurgia ortopédica, tem se destacado como a alternativa, em casos de complicações e falhas nas artroplastias, oferecendo uma abordagem que merece atenção especial.
A publicação de nossa palestra, realizada no Curso de Cirurgia Avançada do Quadril ocorrido em novembro de 2022, no Hospital Sírio Libanês – São Paulo/SP, representando o Instituto do Câncer Dr. Arnaldo Vieira de Carvalho, o primeiro hospital de câncer do Brasil, visa divulgar esta técnica distinta, como solução para casos complexos de revisão em artroplastias fracassadas.
Nos Estados Unidos são realizadas centenas de milhares de artroplastias do quadril anualmente, sendo que as revisões representam cerca de 20% delas. Uma parte significativa dos gastos, evidenciando a importância de soluções eficazes para esses casos.
A classificação de Paprovisky, utilizada pelos cirurgiões do quadril, que cataloga os defeitos femorais, procurando oferecer um parâmetro para orientar o tratamento, cita a utilização das endopróteses por último. O dogma incutido aos cirurgiões de “sempre preservarem o estoque ósseo” tem resultado em inúmeras cirurgias de revisão, representando elevado custo social e criado grandes desastres para os pacientes.
Analisamos dois casos de próteses do quadril, que foram revisadas inúmeras vezes, para ilustrar a complexidade dessas situações e a necessidade de termos a mente aberta para as abordagens inovadoras.
É fundamental reconhecermos que as revisões de artroplastias representam desafios únicos, exigindo um planejamento cirúrgico detalhado, um conhecimento dos materiais e técnicas cirúrgicas descritas, bem como uma compreensão profunda das condições clínicas e expectativas do nosso paciente.
A alternativa do emprego das endoprótese não convencionais e da “ressecção em bloco”, do problemático segmento afetado, deve ser considerada, permitindo-nos oferecer todas as alternativas e optarmos pela de menor morbidade e maior probabilidade do rápido restabelecimento funcional para o paciente idoso.
À medida que avançamos na prática médica, é essencial continuarmos explorando e refinando essas técnicas para oferecer o melhor cuidado possível aos nossos pacientes.
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Artrodese do Joelho com Solução Protética ou Biológica
Em alguns casos de tumores ósseos e de traumas graves, as falências de próteses ou osteossíntese podem representar um desafio significativo. É nesse cenário que a artrodese do joelho emerge como uma alternativa viável. Esta técnica pode ser realizada de diversas maneiras, sendo uma delas com uma prótese do tipo diafisária ou através de uma solução biológica empregando-se enxerto autólogo e osteossíntese.
Por exemplo, quando nos deparamos com a falência de uma prótese primária infectada ou em situações de tumores ósseos agressivos ou traumas, a artrodese pode se tornar uma alternativa à amputação.
Consideremos este caso de condrossarcoma recidivado, após duas tentativas cirúrgicas, sem sucesso, em que a necessidade de uma ressecção ampla se faz presente, e a reconstrução com uma artrodese, pode ser a única alternativa para evitarmos a amputação. Nesses casos, a artrodese empregando uma prótese diafisária pode oferecer a chance de preservação deste membro.
O sucesso exige uma ressecção cuidadosa, com a remoção dos tecidos comprometidos, preservando os vasos poplíteos e nervos da região. Em seguida, é realizada a reconstrução com uma prótese modular do tipo diafisária, neste caso foi especialmente moldada, com a confecção de um segmento de polietileno, visando dar um formato mais estético para a região do “neo joelho”, minimizando o defeito deixado pela extensa ressecção do segmento afetado pelo tumor e atendendo ao objetivo de garantir uma ressecção ampla, com margens oncológicas seguras.
Neste outro exemplo de um tumor de células gigantes, que destruiu todo o planalto tibial e o 1/3 proximal da tíbia, a abordagem pode ser biológica. Nesse paciente, aproveitamos o osso autólogo do próprio local, no caso dos côndilos femorais, para preencher a falha óssea deixada pela ressecção da neoplasia.
É importante ressaltar que a técnica exige precisão e cuidado, tanto na ressecção quanto na reconstrução. A placa utilizada na fixação deve ser posicionada de forma a garantir um alinhamento adequado e evitar rotações indesejadas. A integração da artrodese com o enxerto autólogo biológico é fundamental para o sucesso do procedimento.
Em casos de traumatismos graves, com grande destruição óssea devido a traumas de alta energia, a artrodese pode ser a única opção viável para restaurar a estabilidade do membro e evitar a amputação. Esses casos, que estamos mostrando, foram apresentados no Congresso Internacional de Trauma no Joelho, em Ribeirão Preto – SP, mostrando a nossa experiência com estas duas técnicas de artrodese, empregando próteses diafisária ou osteossíntese com reconstrução biológica. Para mais informações sobre essas técnicas e apreciação de outros casos clínicos semelhantes, visite o site www.oncocirurgia.com.br,
Através do compartilhamento de conhecimento e experiências, poderemos avançar no desenvolvimento para o tratamento de condições ortopédicas complexas.